Sunday, May 11, 2014


Eis-me aqui,
numa janela sem pórtico sentada,
meus olhos vidrados espreitando o mundo;
na orla do abismo permaneço parada,
invejando a vida que se espraia lá no fundo.

Trai-me o "não",
ampara-me o "sim",
tenta-me a queda, o chão,
o salto, o vôo, o fim...

Esqueço, por fim, a retaguarda,
os medos idos, as bestas espelhadas.
Dos lençóis faço asas de alvorada
e lanço-me, rugindo, às ondas entrecortadas.


2014/05/08

Sunday, February 23, 2014



"- Olá, tiveste saudades minhas?"
- Cala-te.
"- Então, isso é lá maneira de falar comigo, tua velha amiga?"
- Deixa-me.
"- Não te posso abandonar."
(Tapo os ouvidos com força.)
"- Não vale a pena fugires-me. Já devias saber isso. Menina tonta."
- Vai embora.
"- Nunca."
- Por favor.
"- Não."
(Caio.)
"- És uma fraca. Só a mim pertences."
- N...ão...
"- Não? Então olha em volta."
- Não!
"- Olha lá em volta, princesinha, olha e vê onde estás!"
(Abraço os joelhos com força, de olhos bem fechados, balançando o corpo.)
- Não, não, nãããão!
"- Não olhas? Pois eu digo-te o que há: nada! Estás sozinha de novo. E eu voltei para ti."
(Paro de baloiçar.)
"- Eu nunca te irei abandonar...mesmo que penses que me fui, eu vou estar sempre à espreita. 
À espera dos teus falhanços, dos teus passos em falso, dos teus deslizes...
daqueles alturas em que a máscara estala e tu choras, 
naquelas alturas em que te odeias e desejas morrer.
Estarei sempre aqui para ti. Sou a tua única amiga.
Por isso anda aqui, deixa-me abraçar-te e olhar-te nos olhos.
És minha. Nasceste só e vais morrer só. Nos meus braços."
(Desisto.)

Monday, February 17, 2014



Há chaves que se queriam perdidas para sempre e baús que se queriam cerrados por eternidades;
há dores que, mesmo antigas, se juntam, em catadupa, a novas mágoas contidas quando se lhes abre a porta;
há momentos em que se revisita a caixa de Pandora, inadvertida ou masoquisticamente, para a encontrar sangrando;
há dias em que as lições que achávamos aprendidas de vez se tornam amnésia...e não cair deixa de ser opção.

Felizmente há chão que nos segure. Quase sempre. O abismo pode esperar.

Saturday, February 8, 2014



- Acorda...
- ...
- Acorda...
- Hum...? 
- Acorda, vá...
- Não...ainda não é hora...não quero...habituei-me ao negrume e à paz...
- Não podes hibernar para sempre...
- Ora, porque não?
- ...
- Então?
- Tu sabes bem porquê...
- Enganas-te...se soubesse já teria regressado.
- Não...
- Não?
- Não...tu sabes bem porquê...e sabes bem para onde vais...tens é medo.
- Medo?
- Sim, medo. Medo que o teu futuro seja mais solitário do que o presente no qual descansas.
- ...