Friday, February 25, 2011


Senta-te aqui. Não fales. Vê-me só. Sim, não sou reflexo. Sou aguçada, de lados rombos, frágeis, de finas subtilezas. Simples no complexo. Desigual. Assimétrica. De difícil encaixe, talvez? Duvido. Não sou dura, mas talco, gesso, qualquer coisa assim, moldável, daquelas em que se enterra os dedos e se deixa mossa, nódoa-negra. Assim sou. Dediquei-me à busca de algo assim, igual. Achei as minhas estranhezas demasiado vincadas para alguém que não eu entender. E juntei-me a algo reprodutível em mim. Paz. Falsa paz. Uma sensação enganadora de estabilidade, mascarada de espelhos. De tal forma que me esqueci do meu próprio rostro. Perdi-o de vista. Mas ele perdoou. Não te queria enterrado na minha vida. Quis afastar-te, mesmo que me doesse, quis salvar-te desta garganta de abismo. Ouviste? Não. E ainda bem. Estendeste-me novas pautas e disseste "acompanha-me". Palavras mágicas, nunca antes ouvidas. Acompanhar e não fundir, até ser inteligível quem é quem. Completar e não eclipsar. Criar algo em vez de reduzir. Franzi o sobrolho. Não me sabia capaz. Ainda não sei se sou. A minha melodia soa-me sempre nasalada, disforme e eu acho-me mancha em vez de brilho. É difícil acreditar depois de tanta queda. Mas de cada vez que te guardo no meu abraço, sorvendo-te o cheiro, roubando-te o brilho no olhar, acredito mais. Penso na improbabilidade de completar alguém. E acrescento-lhe mais um pontinho, na esperança de que alguma vez me possa vir a convencer. Nos entretantos, vou trabalhando. Há coisas que se querem assimétricas, com um desnivelamento aqui e ali. Por isso, não quero aqui encaixes perfeitos. Apenas imperfeições que se completem. E lutem entre si. E saibam quando perder. Porque ganhar também pode ser uma forma de derrota. E eu não quero o primeiro lugar sozinha.

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